sexta-feira, 30 de maio de 2008

Cultura e Educação

Originariamente o termo cultura aponta para a acção de cultivar mediante a qual o homem se ocupa de si mesmo, não ficando num puro estado natural. O homem culto é aquele que se "cultiva". Cultura é, numa primeira aproximação, cultivo da inteligência, educação. O termo cultivar denota atenção, cuidado, acompanhamento. Segundo afirma Yepes a primeira dimensão de cultura é a “interiorização e enriquecimento de cada sujeito”, mediante a aprendizagem. É o que designa o termo alemão “Bildung”, formação do homem. Cultura significa aprender e possuir o aprendido, ter sido educado, ter conhecimento, riqueza interior, mundo íntimo. Quanto mais rico é esse mundo, mais culto se é e mais coisas se tem para dizer. Segundo a perspectiva deste autor, a origem da cultura é o núcleo criativo, discursivo e afectivo da pessoa, a sua intimidade profunda, em que se guardam mediante a memória, conhecimentos apreendidos e factos vividos, uma sabedoria teórica e prática, que cresce para dentro, porque se cultiva e aprende, para, mais tarde, sair para fora. Frente à primazia da exterioridade, o espírito humano caracteriza-se por saber habitar dentro de si e criar um mundo interior que não é sonhado, mas sim vivido. Apenas nele se encontra a verdadeira felicidade e plenitude. É o lugar de encontro com a própria intimidade, santuário interior, poço profundo onde habitam os sentimentos mais poderosos, realidade criadora de que brotam ideias, projectos, imagens, mundos novos que acabarão por sair para o exterior. A pessoa humana ama a paz e o silêncio porque lhe permitem sonhar, imaginar, escutar a sua voz íntima, sentir o que tem dentro: saber ouvi-la é ter cultura. “A descoberta da interioridade e o seu cultivo são requisitos para uma verdadeira cultura” (Yepes 1996). Ter o espírito cultivado é saber ler as obras humanas e descobrir nelas uma riqueza desconhecida para o ignorante. O olhar de quem percebe muito de pintura ou história da arte “lê” mais e melhor um quadro de Rembrandt ou uma catedral gótica. A cultura está depositada em obras exteriores e o homem ao apreendê-la fá-la sua e compreende-a. Saber dizer bonitos discursos é expressão e reflexo de um espírito cultivado e de algo previamente apreendido. A cultura como interioridade é, pois, precedida pela aprendizagem, que é a incorporação da sabedoria depositada nas obras humanas. Sem elas não há cultura. Em certo sentido, cultura é toda a manifestação humana (Yepes 1996). A capacidade de manifestar é uma característica da pessoa e expressão exterior da sua interioridade. As acções mediante as quais a pessoa se expressa e se manifesta - acções expressivas - são também cultura. Por exemplo, saber falar, dar as boas vindas a quem chega, um aperto de mão, não fechar a porta na cara a uma pessoa, é também cultura, educação. A má educação é incultura, barbaridade, força bruta. O que define o homem como ser cultural é a capacidade de revestir o material de um significado ou intenção que procedem do mundo interior e que remetem ou ordenam a obra humana a algo distinto dela. Quando a matéria é enriquecida ou transformada pela pessoa, quando surge uma obra exterior que parece falar por si mesma, temos uma outra dimensão da cultura: as obras humanas - um livro, uma escultura, etc. - são expressões culturais. A capacidade humana de criar cultura plasma-se num conjunto de objectos modificados pelo homem com um significado que lhes confere uma função expressiva da interioridade humana. Esta função de expressar é comunicação: expressa-se algo para comunicar, que é um elemento básico da vida social. O conjunto dos objectos culturais ou obras humanas feitas com uma função simbólica é a cultura em sentido objectivo: o cultural remete para além de si próprio. O símbolo é um objecto que nos envia a outro. O carácter simbólico ou significativo das obras humanas é convencional, livre e modificável. A cultura é tão variada como a liberdade: cada povo, cada pessoa realiza as suas obras imprimindo nelas o selo do seu estilo, da sua personalidade, do seu tempo. A cultura é livre, e portanto, convencional, variável, histórica. Podem distinguir-se na cultura humana várias dimensões: "expressiva, comunicativa, produtiva, simbólica, histórica" (Yepes 1996). A expressão do espírito humano é cultura em estado vivo, plasmando-se, plena de um carácter criador, original. Todas as obras culturais levam dentro de si uma verdade que podemos chegar a compreender, com tempo e esforço, embora só parcialmente; parece predominar nelas uma beleza que se comunica, que nasce da verdade que expressam. Podem ser cultura, em sentido amplo, os gestos, a conduta, a linguagem falada, os costumes ou gestos repetidos tantas vezes que facilmente se convertem em rituais e nos quais se alicerça a vida humana.

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